Theses defended
O elevado custo da custo-eficiência: Uma crítica do comércio de carbono
April 28, 2016
Governance, Knowledge and Innovation
José Castro Caldas
O comércio de carbono, enquanto uma política climática de mercado que permite aos poluidores cumprir com compromissos de redução de emissões recorrendo a direitos de poluição transacionáveis, é apresentado pelos seus proponentes como a alternativa mais eficiente para a mitigação das alterações climáticas, enquanto oponentes contrapõem que o argumento baseado na custo-eficiência negligencia os prejuízos que resultam da mercantilização do carbono. Esta tese contribui para este debate, que é fundamental para o futuro das políticas ambientais, expondo os custos sociais do comércio de carbono e posicionando-se contra a inclusão do comércio de carbono no leque de políticas climáticas. A argumentação aqui desenvolvida é baseada nas contribuições teóricas sobre os custos sociais de atividades privadas e conflitos de valores, assim como perspetivas críticas sobre a neoliberalização da natureza e os limites do mercado.
O comércio de emissões foi primeiramente proposto como uma alternativa às taxas ambientais pigouvianas maximizadoras da eficiência. Baseado na perspetiva sobre custos sociais assente em direitos de propriedade, o comércio de emissões permitiria ao regulador escapar à impossível tarefa de calcular um nível ótimo de poluição e providenciaria em alternativa uma forma custo-eficiente de atingir um nível de poluição determinado exogenamente. Esta transição teórica permitiria à Economia centrar-se na discussão dos melhores meios par atingir fins dados e esquivar-se à discussão dos fins. A dicotomia fins-meios, no entanto, não se aplica fora da teoria económica, tal como a descrição do comércio de emissões como uma alternativa simples e eficiente à regulação direta. Como a experiência dos EUA com o comércio de emissões demonstra, criar mercados para direitos de poluição transacionáveis requer investimento governamental num aparato regulatório que não é menos complexo do que é requerido pela regulação direta ou pela taxação. Esta experiência também ilustra o quanto a alegada eficiência dos mercados de emissões é resultado do seu fraco desempenho ambiental e da sua desconsideração pela justiça social e pela participação democrática.
Os mercados de carbono criados ao abrigo do Protocolo de Quioto suscitam problemas adicionais. Comparados com os esquemas de "limitação e comércio" baseados num único poluente e um número restrito de fontes, esquemas como o Sistema Europeu de Comércio de Licenças de Emissão são mais complexos e requerem maior intervenção governamental. Para mais, instrumentos flexíveis como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo permitem aos países industrializados poluir além dos seus compromissos de emissões e suscitam preocupações com a integridade disputável de metodologias que contabilizam reduções de emissões de projetos de compensação em relação a um cenário de referência arbitrário. O fraco desempenho ambiental destes esquemas é ilustrado pela sua incapacidade de incentivar a descarbonização, enquanto distribuem rendas aos poluidores e criam novas fontes de corrupção.
Estas questões não são redutíveis a discussões sobre procedimentos contabilísticos e outras tecnicalidades. Abrindo a "caixa negra" da quantificação e comensuração do carbono, é revelado que os seus cálculos marginalizam incertezas relevantes e assumem um grau de precisão que o conhecimento científico e a tecnologia não podem providenciar no presente. No entanto, dado que contabilizar aumentos e reduções de emissões requer decisões políticas sobre o que deve ser contabilizado, qual a métrica relevante e o que é um grau de incerteza aceitável, avanços científicos e tecnológicos não são condição suficiente para que seja possível produzir os números inequívocos que o comércio de carbono requer.
Indo mais longe na discussão sobre as implicações da comensuração e abstração de carbono, esta tese apresenta um argumento contra a inclusão do comércio de carbono no leque de políticas climáticas, baseado em quatro críticas normativas. Com o apoio da literatura crítica, é defendido que o comércio de carbono é ineficaz, antidemocrático, injusto e antiético e que, por estas razões, só pode ser considerado como uma política custo-eficiente quando os seus custos sociais são ignorados. Um argumento contra o reformismo do comércio de carbono é então apresentado mostrando como tentar contrariar os efeitos negativos dos mercados de carbono através de restrições ao comércio conduz à erosão destes mercados. Uma melhor alternativa é o apoio a políticas climáticas que fomentam uma pluralidade de valores e providenciam benefícios sociais.A tese conclui defendendo uma mudança no debate sobre política climática no sentido da discussão dos valores que são fomentados ou prejudicados por cada política. Um enquadramento geral é proposto que respeita o pluralismo de valores e reconhece conflitos entre valores incomensuráveis, o que não é compatível com políticas de mercado.
Palavras chave: Comércio de carbono, mercados de emissões, créditos de carbono, política climática, Protocolo de Quioto
Public Defence date
Doctoral Programme
Supervision
Abstract
O comércio de emissões foi primeiramente proposto como uma alternativa às taxas ambientais pigouvianas maximizadoras da eficiência. Baseado na perspetiva sobre custos sociais assente em direitos de propriedade, o comércio de emissões permitiria ao regulador escapar à impossível tarefa de calcular um nível ótimo de poluição e providenciaria em alternativa uma forma custo-eficiente de atingir um nível de poluição determinado exogenamente. Esta transição teórica permitiria à Economia centrar-se na discussão dos melhores meios par atingir fins dados e esquivar-se à discussão dos fins. A dicotomia fins-meios, no entanto, não se aplica fora da teoria económica, tal como a descrição do comércio de emissões como uma alternativa simples e eficiente à regulação direta. Como a experiência dos EUA com o comércio de emissões demonstra, criar mercados para direitos de poluição transacionáveis requer investimento governamental num aparato regulatório que não é menos complexo do que é requerido pela regulação direta ou pela taxação. Esta experiência também ilustra o quanto a alegada eficiência dos mercados de emissões é resultado do seu fraco desempenho ambiental e da sua desconsideração pela justiça social e pela participação democrática.
Os mercados de carbono criados ao abrigo do Protocolo de Quioto suscitam problemas adicionais. Comparados com os esquemas de "limitação e comércio" baseados num único poluente e um número restrito de fontes, esquemas como o Sistema Europeu de Comércio de Licenças de Emissão são mais complexos e requerem maior intervenção governamental. Para mais, instrumentos flexíveis como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo permitem aos países industrializados poluir além dos seus compromissos de emissões e suscitam preocupações com a integridade disputável de metodologias que contabilizam reduções de emissões de projetos de compensação em relação a um cenário de referência arbitrário. O fraco desempenho ambiental destes esquemas é ilustrado pela sua incapacidade de incentivar a descarbonização, enquanto distribuem rendas aos poluidores e criam novas fontes de corrupção.
Estas questões não são redutíveis a discussões sobre procedimentos contabilísticos e outras tecnicalidades. Abrindo a "caixa negra" da quantificação e comensuração do carbono, é revelado que os seus cálculos marginalizam incertezas relevantes e assumem um grau de precisão que o conhecimento científico e a tecnologia não podem providenciar no presente. No entanto, dado que contabilizar aumentos e reduções de emissões requer decisões políticas sobre o que deve ser contabilizado, qual a métrica relevante e o que é um grau de incerteza aceitável, avanços científicos e tecnológicos não são condição suficiente para que seja possível produzir os números inequívocos que o comércio de carbono requer.
Indo mais longe na discussão sobre as implicações da comensuração e abstração de carbono, esta tese apresenta um argumento contra a inclusão do comércio de carbono no leque de políticas climáticas, baseado em quatro críticas normativas. Com o apoio da literatura crítica, é defendido que o comércio de carbono é ineficaz, antidemocrático, injusto e antiético e que, por estas razões, só pode ser considerado como uma política custo-eficiente quando os seus custos sociais são ignorados. Um argumento contra o reformismo do comércio de carbono é então apresentado mostrando como tentar contrariar os efeitos negativos dos mercados de carbono através de restrições ao comércio conduz à erosão destes mercados. Uma melhor alternativa é o apoio a políticas climáticas que fomentam uma pluralidade de valores e providenciam benefícios sociais.A tese conclui defendendo uma mudança no debate sobre política climática no sentido da discussão dos valores que são fomentados ou prejudicados por cada política. Um enquadramento geral é proposto que respeita o pluralismo de valores e reconhece conflitos entre valores incomensuráveis, o que não é compatível com políticas de mercado.
Palavras chave: Comércio de carbono, mercados de emissões, créditos de carbono, política climática, Protocolo de Quioto